Manual de Jornalismo
Anabela Gradim, Universidade da Beira Interior
Maio de 2000
6º de 6 ficheiros
10. O jornal digital, Fazer
jornalismo para o novo medium; 10.1. A internet e
a profissão de jornalista; 10.2. Urbi digital; 11. Enquadramento legal da actividade jornalística; 11.1. Direitos dos Jornalistas; 11.2. Deveres
dos Jornalistas; 12.
Sugestões de Leitura.
Fazer jornalismo para o novo medium
“Agradecemos
à imprensa o trabalho desenvolvido ao longo destes últimos 200 anos. Agora
adeus.”, é o texto-choque do spot publicitário do Estrella Digital, o
primeiro jornal em suporte exclusivamente digital a surgir em Espanha. Será
mesmo adeus? Alguns entusiastas, apoiados pelos resultados de certos estudos,
parecem pensar que sim. A questão está longe de ser linear, e os resultados dos
estudos que sobre esta matéria têm vindo a lume demasiado contraditórios para
permitirem conclusões definitivas. “Newspapers said Monday that reports of
their death by internet were greatly exagerated”, noticiava pela mesma altura a
Reuters.
Assim, a par de
trabalhos, sobretudo nos Estados Unidos, que avançam números preocupantes
relativamente à perda, e seu previsível aumento, de leitores dos jornais
tradicionais, em favor dos digitais, outros afirmam, pasme-se, precisamente o
contrário.
Duas coisas
parecem certas: a indústria pode mudar muito, de formas imprevisíveis, mas não
vai desaparecer. Para começar, quem marca neste momento presença nas redes, com
jornais, são precisamente as empresas tradicionais, que trataram já, e bem
atempadamente, de reservar um lugar ao sol num mercado cujo potencial de
crescimento é enorme, que já é impossível ignorar, mas cujas formas de evolução
concreta não podem ainda prever-se.
Em vez de
futorologizar, a sensatez recomenda que se atente na história, que esta sim tem
dados bem concretos para oferecer. Sempre que surge um novo medium os habituais profetas da desgraça profetizam quantos dos antigos media estão condenados — e, no entanto, a história prova que, depois de
uma breve fase de predação de públicos, estes tendem a estabilizar.
O livro, um
dos mais antigos meios de comunicação de massas aí está de boa saúde
precisamente para prová-lo - sobreviveu aos jornais, à rádio, à televisão, às
redes, e, esta bem real e predatória, à ameaça das fotocopiadoras.
A situação
assemelha-se muito às eufóricas previsões da década de 80, que garantiam que o
futuro estava no asséptico paperless
office. Na verdade o que se verificou foi precisamente o contrário — os
computadores trouxeram uma maior dependência do papel, e os escritórios
passaram a produzi-lo em quantidades muito mais significativas que no passado.
Menos papel
como se esperava? Não. Mais, mas diferente. Um estudo de finais de 1999
realizado pelo Boston Consulting Group
[55]
revela que, nos próximos cinco anos, os hábitos de consumo de papel vão
continuar a mudar. O e-mail poderá
provocar um decréscimo no consumo de envelopes da ordem do um milhão de
toneladas; esperando-se ainda descidas nos impressos, formulários, fine papers, papéis de qualidade mais
requintada, e nos trabalhos de tipografia. Em contrapartida, até 2003, o consumo
de papel de escritório — utilizado nos prints domésticos — deverá duplicar. Globalmente a produção e consumo de papel
continuará a crescer.
Em sentido
semelhante, em relação aos jornais digitais, apontam outros trabalhos. Um
estudo encomendado pela Newspaper Association of America (NAA), entidade que
representa mais de dois mil jornais dos Estados Unidos e Canadá concluiu que 82
por cento de online readers liam a
edição impressa do seu jornal, tantas vezes, ou ainda mais vezes, do que antes
de estarem online
[56]
.
Cinquenta e um por cento dos consumidores de notícias haviam, nos últimos seis
meses, acedido a jornais online. Boas
notícias para a indústria, especialmente porque entre as conclusões da NAA se
confirma que a confiança no produto e o valor que lhe é dado continua
intimamente ligado à reputação e ao brand
name do jornal, um capital de valor inestimável que não é destruído pelo
simples aparecimento de uma nova tecnologia.
Atenta, a
indústria esforça-se agora por explorar sinergias e complementaridades entre os
dois media, e não perder a dianteira
nas novas áreas de negócio entretanto surgidas. John Sturme, presidente
da NAA, comenta o estudo, garantindo que “the internet is one of the few media
to come along that provide a perfect partnership for traditional newspapers. It’s
a natural extension of our business, giving newspapers the space, immediacy and
expanded audience that flow so nicely from the printed product. This study
demonstrates not only the success newspapers have had in leveraging the internet,
but also the tremendous potential that online represents”
[57]
.
Simbiose, e
exploração das complementaridades e potenciais pode muito bem ser o futuro.
Nada indica que os jornais na versão ink-stained venham a desaparecer. Poderão transformar-se, adaptando-se — e isso muitas
vezes implica custos materiais e humanos, mutações e sobrevivência dos mais
aptos — mas permanecerão também nesse formato. E os digitais — que
presentemente marcam sobretudo lugar, mas deverão nos próximos anos entrar em
fase de rendibilidade, nomeadamente através dos classificados, publicidade, e
oferta de serviços pagos —conquistarão o seu lugar ao sol.
São muitas
as vantagens de um jornal impresso. Em primeiro lugar, não se pode falar de dumping, mas a verdade é que o custo da maioria
— entre os 100 e os 400 escudos — não oferece grandes lucros em relação ao
papel e a tinta oferecidos ao consumidor. Portanto, tal como os digitais, é um
produto que não incorpora o real custo de produção. A consequência é que fazer home printing da totalidade, ou mesmo só
metade de um jornal digital, sai muitíssimo mais caro do que comprar a versão
impressa.
Esta, por
seu turno, é mais facilmente transportável e manuseável; leva-se para a praia,
o café, o autocarro, o emprego. O jornal de papel continua a ser — por muito
que a velocidade dos processadores e a largura de banda das redes se velocize,
de consulta mais rápida que um jornal digital. A leitura em frente a um monitor
é também mais difícil, e susceptível de produzir cansaço visual.
Intervém
ainda para o sucesso dos jornais de papel razões de ordem afectiva e
sentimental. O papel cheira bem. O papel suja as mãos. O papel serve para
embrulhar sardinhas e castanhas. Pode ser lido ao pequeno almoço, num jardim,
na praia ou num sofá em desalinho. Folheado, sublinhado, recortado, emprestado
e relido.
Os digitais
também têm os seus argumentos, e um potencial enorme em matéria de novidades.
São interactivos, permitindo reagir imediatamente às notícias publicadas, ou
contactar directamente, por e-mail, a
maioria dos autores dos textos. As peças podem, por hiperlinks, remeter directamente para artigos relacionados,
arquivo, ou background dos dados
fornecidos. Possibilitam a realização de inquéritos on-line — que, não tendo valor propriamente científico, são todavia
um meio de tomar o pulso aos leitores da publicação. Podem organizar debates,
dossiers, temas de discussão sustentados por mailing-lists e canais de IRC. Muitos possuem arquivos online, e mesmo motores de busca capazes
de aceder a todo o espólio digital. O webcasting permite a selecção e entrega personalizada de notícias. A busca de emprego,
casa ou carro nos classificados pode ser acelerada através de motores de
pesquisa. Além disso, a publicidade pode ser inserida de forma a que não possa ser
ignorada pelos utilizadores, ao contrário do que sucede por exemplo na
televisão, que, mau grado o dot, ainda não sabe muito bem como lidar com o homo zappiens. Impressão e distribuição,
actividades caras e morosas, são, nas publicações digitais, coisa do passado.
Tudo isto já
está em curso, e nalguns jornais todos estes meios disponíveis simultaneamente.
Mas muito mais se adivinha. Não são destituídas de fundamento as visões que
antecipam a fusão do telefone, hi-fi,
vídeo, televisão e computador pessoal num único electrodoméstico. E os jornais
digitais serão os primeiros, ainda antes do nascimento do novo hardware, a antecipar esta convergência,
nomeadamente através dos privilégios concedidos à imagem, do aumento da
interactividade, da introdução de vídeo e áudio clips, e da possibilidade de transmissão de vídeo em tempo real.
E o
fundamental é que, mesmo com a aquisição de meios multimédia, e com a
convergência de recursos que antes pertenciam exclusivamente a outros media, as publicações digitais não
deixarão de ser jornais.
Sturm tem
mesmo razão: a internet, em relação aos jornais, é o medium da perfeita complementaridade. Porquê? A passagem das rádios
e das televisões à internet, àparte a globalização, não traz nada de novo —
continuam a apresentar-se tal e qual como antes, e a imediatidade que a net possibilita aos jornais é um recurso
de que estes media já antes gozavam.
Não há nenhuma diferença entre uma emissão de rádio tradicional, e uma
transmitida pela internet, e quando a houver — um produto não exclusivamente
sonoro, por exemplo — deixaremos de estar perante uma rádio.
O caso dos
jornais é radicalmente diferente. A estes, a internet permite a incorporação
(pilhagem) de todos os recursos antes exclusivos das rádios e televisões — pela
inclusão de som e imagem em movimento — sem com isso perderem a sua identidade,
isto é, deixarem de ser jornais. A net acrescenta aos jornais acidentes novos e cheios de potencial, sem contudo tocar
a sua essência: a de um interface que
não prescinde do texto para apresentação do material noticioso que tem para
oferecer. E vão levantar-se preementes questões de identidade e definição no
futuro. O site da CNN é uma
televisão? Dificilmente. É um site,
mas que se assemelha muito mais a um jornal que a qualquer outra coisa.
E se
pretendem ser os jornais a explorar esta fantástica complementaridade, será
nestes que, em primeiro lugar, se produzirão mutações em termos de produto. É
previsível que as formas de apresentação, e mesmo a escrita, vão sofrer
alterações significativas. Como se escreve uma notícia que está acompanhada por
um clip áudio, ou vídeo? A
complementaridade é certamente diversa da que os textos gozavam junto da
fotografia. Em termos cognitivos, qual a lógica e ordem de apreensão do novo
produto? Que alterações vai sofrer a escrita jornalística? Que protocolos de
apresentação surgirão entretanto?
Os jornais
digitais de informação geral começaram por ser transposições dos textos e
imagens, da versão impressa para a internet. Rapidamente, porém, trataram de
enriquecer-se com outros serviços: subscrições online, inquéritos, arquivos de edições passadas, correio dos
leitores. Não é inocente que hoje, o grosso das cartas dos leitores publicadas
na versão ink-stained por um diário
de grande tiragem como o Público — verificando-se expressões mais modestas
disso também nos jornais regionais — sejam recebidas por e-mail. O sistema é rápido, barato, extremamente fiável, e está
acessível a um número cada vez maior de leitores.
Com o
surgimento de jornais diários exclusivamente digitais, de que são exemplos o Estrella e o Diário Digital, já não há um modelo prévio que, até por razões de
economia, possa ser transposto ipsis
verbis para o seu mais modesto sósia na internet. Os jornalistas de tais
órgãos de comunicação escrevem exclusivamente para a sua publicação digital, e
poderão rapidamente encontrar formas de o fazer melhor do que a comum
apresentação dos jornais tradicionais. A verdade é que se poderão vir a
fazê-lo, ainda não o fizeram: tais publicações não representam para já
inovações de monta nem modelos de ruptura com as formas tradicionais de fazer
jornalismo, que continuam como matriz do material produzido. O que não
significa que o novo medium, a
internet, não esteja a ter profundo impacto no trabalho diário dos jornalistas.
10.1. A internet e a profissão de jornalista
Se ainda não
existe propriamente uma escrita digital, também
é certo que o novo medium já
revolucionou a forma como os jornalistas trabalham, e hoje não é mais possível
a nenhum profissional ignorá-lo.
Em primeiro
lugar a internet constitui-se como fonte privilegiada de consulta para o background dos mais variados temas. Hoje
a informação é verdadeiramente global, e as limitações que se prendiam com
meios periféricos e aspectos de distribuição, inexistentes — é possível aceder
ao site da CNN, mas também a jornais da remota cidade da Guarda, ou do Nordeste
brasileiro. O uso maioritário do inglês, e os programas de tradução, como o babelfish, um dos primeiros a surgir,
ajudam a tornear as dificuldades da
língua.
A notícia,
atributo divino, tornou-se ubíqua — está em toda a parte, instantaneamente. E a
reportagem vive também com mais preemência o preço dessa instantaneidade: é preciso noticiar sobretudo depressa, e
eventualmente, se possível, bem. Interessa cada vez mais a velocidade com que
os conteúdos são disponibilizados. Os antigos manuais de jornalismo ensinavam
aos estudantes a máxima de que “nada é tão velho como jornal do dia anterior”.
Agora já não é precisamente assim — podemos muito bem estar a falar da novidade
de há poucas horas atrás.
Este desmultiplicar vertiginoso de meios
tem sido fascinante para os jornalistas, mas não está isento de perigos. Por um
lado, hoje é possível a um único indivíduo, armado de um computador e de um
modem e recorrendo ao clássico, mas agora digital, corta e cola, produzir um jornal inteiramente sozinho e
distribui-lo para todo o mundo. Dadas as características da rede, não há
praticamente meios para detectar um plagiador e apontá-lo
[58]
.
Sobretudo se dominar línguas e proceder a traduções da sua lavra.
E isto
levanta questões assustadoras, como a da autenticidade dos conteúdos e,
princípio sagrado do jornalismo ocidental, verificação de dados e confirmação
da fidedignidade das fontes. A par da democratização dos conteúdos e do livre
acesso a muitas fontes, as notícias podem, por esta via, estar mais permeáveis
a manipulações ou erros.
O open source, que teve o seu parto com o
aparecimento do sistema operativo Linux, desenvolvido nas suas grandes linhas
mestras por um criador, e depois aberto à comunidade para aperfeiçoamento,
finalização, bug fixing e criação de
software específico, rapidamente fez a sua entrada triunfante em sites de áreas muito distintas: da
fabricação de dicionários, a sites de tremendo sucesso como o slashdot.org,
que se dedica à classificação valorativa e divulgação de sites na internet, e ao posting de notícias relacionadas com as novas tecnologias. Há voluntários para
trabalhar gratuitamente no negócio dos outros, pode perguntar-se? Numa
comunidade com mais de 275 milhões de utilizadores em todo o mundo, dos quais
136 se encontram na América do Norte
[59]
,
para o slashdot o drama tem sido
seleccioná-los e geri-los.
A questão
que muitos hoje colocam, e porque o mundo inteiro parece estar sedento dos seus
cinco segundos (já não minutos) de fama — também sou importante: alguém que me
escute, por favor — é se o open source poderá entrar também no newsbusiness,
e em tal caso que efeitos teria.
Se as
notícias não vierem a transformar-se numa espécie de talk show do bizarro, misto de factos com ficção, rumores com
revelações, mitos com incontinência verbal de onde se poderão, no limite, extrair apenas meta-dados de interesse
puramente sociológico, então o open
source não pode fazer carreira no universo das notícias.
Um jornal
digital de informação geral — sobre factos reais ocorridos no mundo,
testemunhados, comprovados ou averiguados por quem os narra — em formato de open source nunca pode ser mais do que
uma banca de rumores e boatos, por muitas e excelentes razões.
Em primeiro
lugar, torna-se obviamente impossível verificar a credibilidade das fontes. O site é vulnerável a todo o tipo de
ataques: do mitómano, ao impostor, passando pelo mentiroso compulsivo, até aos
profissionais de imagem e de marketing no legítimo cumprimento das suas
funções. Fazer notícias exige também alguma preparação, intelectual,
deontológica, e prática — presumir possuir tais virtudes não é o mesmo que
demonstrá-lo.
Além de tudo
isto fazer notícias implica presenciar acontecimentos, o que é sempre
dispendioso em termos de logística e requer, as mais das vezes, uma organização
burocrática de rectaguarda algo rígida. E já que se fala em burocracia, aceder
às fontes também é um processo que conhece algumas, incluindo a indispensável
credenciação dos jornalistas, e a identificação, sem margem para dúvidas, dos
órgãos onde exercem a sua actividade.
Exceptuando restritas áreas
tecnológicas, recensões, crítica de arte, software,
ou cinema — aquelas precisamente onde nenhuma destas condições é absolutamente
necessária — e onde parecem estar a
resultar alguns projectos de open source, o formato não se afigura adequado à transmissão de hard news. O jornalismo, como bem se depreende da primeira à última
página deste manual, é um artesanato. O maior capital de um jornal, e o único
do jornalista, é o seu brand name, uma reputação profissional
impoluta, a credibilidade junto dos leitores e a confiança conquistada ao longo
dos anos. Não basta entusiasmo e vontade de protagonismo. Fontes anónimas,
jornalistas de ocasião, nada disto têm para oferecer.
É
humorístico o subtítulo do cabeçalho do Slashdot — News for Nerds, mas também muito apropriado. É que o site funciona da seguinte forma. Depois dos postings das notícias, os leitores comentam-nas, complementam-nas e
precisam-nas.
À partida,
pensar-se-ia que esta é uma forma democraticamente inovadora de controlar a
veracidade e fidedignidade dos relatos. Só que os resultados desmentem-no.
Raras são as notícias que não geraram perto da centena de comentários, os quais
em casos mais raros podem chegar às três centenas. Congestão, info-glut? Dada a enormidade do
acontecimento, tais expressões nem se aplicam. Estamos perante uma espécie de
Fátima Lopes, realizado no Estádio de Alvalade com lotação completa, e onde
todos, incluindo o apresentador, são os convidados. Todos falam, mas ninguém
pode ouvi-los.
Mesmo que
fosse possível ler uma notícia, e os 300 comentários que a precedem, no final
da maratona o que poderia um leitor concluir de tantas, tão díspares e
contraditórias informações senão um socrático só sei que nada sei?
Estes
números também atestam, evidentemente, o indesmentível sucesso do slashdot. O News for Nerds não está condenado. Pelo contrário, representa um
mercado em crescimento. Só que procurar obter informação geral, do tipo da que
oferecem os jornais, numa página com tal formato é absolutamente impossível. A
imagem que um site deste tipo evoca é
a de um imenso buraco negro — uma zona onde a densidade da matéria é tão
elevada que dela nada pode escapar, nem a luz.
Problemas
semelhantes coloca a questão das relações entre bases de dados e jornalismo São
de meados da década de 90 as primeiras previsões de que a disponibilização de
conteúdos na internet iria tornar obsoleta a profissão de jornalista. Hoje
complementam-nas asserções de que as bases de dados, pelas possibilidades de
pesquisa e cruzamento de informações de acordo com infinitas variáveis, que
serão as que melhor servem os interesses do pesquisador, acabarão por ter o
mesmo efeito.
O
que se defende aqui é que todas estas formas de acessar informação fazem
sentido, e vão naturalmente coexistir. Mas não ameaçam nem os jornalistas, nem
as suas publicações. Os jornalistas, como profissionais altamente treinados,
serão é os seus primeiros e mais directos beneficiários. Agora as antevisões de
que as novas formas canibalizam as antigas esquecem que o jornalismo é antes de
mais actualidade, e complementarmente descoberta. Face aos campos de pesquisa
em branco de uma base de dados, se não se souber clara e precisamente o que
pesquisar, o exercício redundará em pura frustração. Depois, há muitos assuntos
dos quais só se toma conhecimento porque um jornal os seleccionou e conseguiu
apresentá-los de uma forma suficientemente atractiva para captar a atenção dos
leitores. Isto, é descoberta, e também a essência da informação: trazer
novidades de interesse geral a um público vasto. Um motor de busca ou uma base
de das não podem substituir este serviço inestimável que um jornal presta aos
seus leitores. Podem, e muito bem, complementá-lo. E continuarão a fazê-lo cada
vez mais no futuro. Mas tão só.
Encontrando-se
aberto a um certo experimentalismo, dadas as suas características de jornal
universitário, e não comercial, o Urbi et
Orbi adoptará, enquanto sedimenta rotinas, procedimentos e conteúdos, uma
postura que não é de ruptura face à forma tradicional de fazer jornalismo.
Como
instrumento ao serviço da vasta comunidade académica que a UBI é, procurará
informar correcta, fidedigna e imparcialmente os seus leitores àcerca de todos
os assuntos de interesse para a universidade.
Como
laboratório para os alunos do curso de Ciências da Comunicação que optaram por
jornalismo, procurará que pratiquem, ainda que com limitações, o tipo de
trabalho que desempenharão mais tarde como estagiários e profissionais de
comunicação social.
Mas também
tem a pretensão de atender à especificidade do meio em que é produzido, e aqui
investe preferencialmente no potencial de instantaneidade; no privilegiar da
imagem; nos textos curtos; no entabulamento de diálogo com outras fontes,
através de hiperlinks; e no
desdobramento de páginas por forma a obviar aos incómodos da leitura face a um
monitor.
Assim, ao contemplar a instantaneidade,
permite e encoraja alterações aos temas tratados na edição do jornal, sempre
que os novos desenvolvimentos da notícia se verifiquem depois da saída de um
número e antes da publicação do próximo.
Tais alterações devem todavia assumir a
forma de uma nova e distinta notícia, que coexiste com a editada na publicação
original, e ainda ser inequivocamente assinaladas, de forma a que o leitor
compreenda quando foram feitas e porquê.
Introdução de desenvolvimentos sob a
forma de notícias de última hora é um
mecanismo que não existe num jornal tradicional em papel. O mais próximo que
estes chegam é, em casos raros — a Guerra do Golfo, por exemplo — à tiragem de
edições especiais; mas banal em televisão, com a interrupção de emissões para
especiais de informação sempre que o peso de uma notícia o justifica.
As notícias de última hora no Urbi et Orbi equivalem assim, grosso
modo, aos especiais das televisões, e deverão ser realizadas tendo em conta os
mesmos critérios editoriais: sempre, mas também apenas e só, quando a importância da notícia e dos
desenvolvimentos ulteriores o justificarem. Deverão além disso ser reeditadas
na edição subsequente do jornal, já que alguns leitores, que concluiram a leitura
da publicação antes da introdução das novidades, podem não se ter apercebido do
seu aparecimento.
Sempre que
os meios técnicos o permitirem, o Urbi et
Orbi privilegiará a imagem e a fotolegenda, concedendo-lhe o merecido
destaque face aos textos que a acompanham. Além disso, publicará por vezes
reportagens fotográficas, à semelhança de port-folios,
onde o texto desempenhará um papel perfeitamente secundário.
Devido ao
bombardeamento sensorial a que diariamente os leitores estão sujeitos, e também
ao cansaço visual que a leitura num monitor propicia, acolherá
preferencialmente textos vigorosos, curtos, apelativos e de grande riqueza
informacional. O mesmo vale para os títulos que acompanham tais textos. Quando
o assunto o permitir, será desenvolvido, à margem do corpo do texto, em caixas
a uma coluna que ladeiam o texto principal.
As
reportagens mais desenvolvidas serão paginadas de forma peculiar: a um título e
foto apelativos em página de rosto, segue-se um lead mais desenvolvido que o
tradicional — pode falar-se de um texto curto — que sumariza e apresenta os
assuntos sobre que versa o trabalho. Os subtítulos de tais textos, serão
apresentados como hiperlinks no final desta página, remetendo cada um deles
para uma nova página, curto e autónomo, acompanhado de uma foto, desenvolve o
assunto a que se refere. Devido a esta peculiar forma de paginação, o domínio
da técnica de construção por blocos é muito valorizado.
Nos
trabalhos em que tal for possível, o redactor esforçar-se-á por promover o
entabulamento de diálogo com outras fontes, através de hiperlinks inseridos no corpo do texto, e que podem remeter para
outras notícias, outros órgãos de comunicação social, sites, dados de
background, arquivo do próprio jornal, dados geográficos ou estatísticos, e
informações biográficas sobre os protagonistas.
11.
Enquadramento legal da actividade jornalística
Em Portugal
a actividade jornalística encontra-se regulamentada pela Lei de Imprensa, Lei
2/99 de 13 de Janeiro, a qual consagra a liberdade de imprensa e de empresa, e
define as regras para a criação de empresas jornalísticas; pelo Estatuto do Jornalista; Estatuto da
Imprensa Regional; Regulamento da Carteira Profissional, e Código Deontológico.
Os crimes cometidos através da imprensa remetem para as disposições legais
contidas na lei geral: Código Penal e Código Civil.
Nas
convenções internacionais de que Portugal é signatário, Declaração Universal
dos Direitos do Homem, e Convenção Europeia dos Direitos do Homem, consagra-se
o direito à liberdade de criação, expressão e empresa. Também a Constituição da
República reitera, em linhas muito gerais, esses princípios.
A Declaração
Universal dos Direitos do Homem proclama, no seu artº 19º, a liberdade de
expressão, de opinião e de informação, as quais implicam “o direito de não ser
inquietado pelas suas opiniões, e o de procurar, receber e difundir, sem
consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de
expressão.
A Convenção
Europeia dos Direitos do Homem, salvaguardando embora o direito dos estados a
submeterem alguns media a um regime
de autorização prévia, consagra no seu artº 10º que “qualquer pessoa tem
direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de
opinião e a liberdade de receber ou transmitir informações ou ideais sem que
possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem consideração de
fronteiras”. Salvaguardada fica
igualmente a possibilidade de regulamentação — condições, restrições ou sanções
— que visem “proteger a segurança nacional, a integridade territorial, a defesa
da ordem e prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, a protecção da
honra ou dos direitos de outrém, ou para impedir a divulgação de informações
confidenciais...”.
Na
Constituição da República Portuguesa são definidos princípios gerais
respeitantes à liberdade de imprensa, opinião, expressão e empresa, bem como as
responsabilidades decorrentes desses direitos.
11.1. Direitos dos Jornalistas
São direitos dos jornalistas, consignados na Lei de
Imprensa:
- A liberdade de expressão e criação;
- A liberdade de acesso às fontes de informação,
incluindo o direito de acesso a locais públicos para fins de cobertura
informativa;
- O direito ao sigilo profissional;
- Garantia de independência e cláusula de consciência;
- O direito de participação na orientação do órgão onde
trabalha;
Este direito
de participação materializa-se, nas empresas com mais de cinco jornalistas
profissionais, através da eleição do Conselho de Redacção, um órgão que
intervém na vida da publicação, nomeadamente através de:
- O direito de se pronunciar sobre a nomeação ou
destituição dos elementos da direcção;
- Colaborar com a direcção na elaboração do estatuto
editorial e emitir parecer sobre as alterações que eventualmente lhe venham a
ser introduzidas;
- Emitir parecer, quando solicitado, sobre a conformidade
de textos ou imagens com o estatuto editorial da publicação;
- Pronunciar-se sobre assuntos que se relacionem com o
exercício da actividade jornalística;
- Ser ouvido nos casos de admissão ou responsabilidade
disciplinar dos jornalistas profissionais da casa;
O Estatuto
do Jornalista, Lei nº 1/99, aprovada pela Assembleia da República a 13 de
Janeiro, regulamente e explicita os direitos consignados na Lei de Imprensa,
nomeadamente:
- Garantindo o direito de acesso às fontes pelos Órgãos
da Administração Pública, empresas com participação majoritária do Estado, ou
concessionárias de serviço público;
- Em caso de recusa de acesso, assegurando que gozam
de regime de urgência as reclamações
apresentadas por jornalistas à Comissão de Acesso aos Documentos
Administrativos;
- Os jornalistas não podem ser impedidos de aceder a
locais públicos ou abertos à generalidade da Comunicação Social, e no âmbito do
exercício desse direito — que pode ser limitado pela exigência de credenciação
prévia — são abrangidos por um regime especial que permite a circulação e
estacionamento de viaturas utilizadas no exercício da profissão.
- O direito ao sigilo implica que os jornalistas não
podem ser obrigados a revelar as suas fontes de informação, não podendo sofrer
quaisquer sanções pelo seu silêncio. De igual modo, os elementos do órgão de
informação que tiverem conhecimento da identidade de tais fontes, não podem
revelá-las sem o consentimento por escrito do jornalista.
- Apenas por mandado judicial podem os jornalistas ser
obrigados a exibir, revelar ou entregar os elementos recolhidos durante o
exercício da profissão.
Para
proteger a independência dos jornalistas, e regulamentar a cláusula de
consciência, o Estatuto do Jornalista assegura que estes profissionais “não
podem ser constrangidos a exprimir ou subscrever opiniões, nem a desempenhar
tarefas contrárias à sua c, nem podem ser alvo de medidas disciplinares em
virtude de tal recusa”. No caso de alteração profunda da linha editorial da
publicação, da qual sobrevenham incompatibilidades com as convicções ou
consciência do jornalista, este pode rescindir o contrato de trabalho que o
liga à empresa invocando justa causa, e tendo consequentemente direito à
respectiva indemnização. Além disso, todo o jornalista profissional pode
recusar ordens ou instruções com incidência em matéria editorial, quando
emitidas por alguém não habilitado com título profissional.
Na Imprensa
Regional, os jornalistas ou os órgãos que representam têm ainda direito a:
- Acesso especialmente favorável aos produtos
informativos da agência noticiosa nacional;
- Contribuição da Administração Central para a formação
de jornalistas e colaboradores da imprensa regional, nomeadamente através de
apoios a conceder à realização de estágios profissionalizantes, especialização
e reciclagem.
Constituem
deveres dos jornalistas, de acordo com o artº 14º do respectivo estatuto:
- Respeitar escrupulosamente o código deontológico dos
jornalistas
- Exercer a actividade com respeito pela ética
profissional, informando com rigor e isenção;
- Respeitar a orientação e os objectivos definidos no
estatuto editorial do órgão onde exerçam a sua actividade profissional;
- Não formular acusações sem provas e respeitar a presunção
de inocência
- Não identificar, directa ou indirectamente, as vítimas
de crimes contra a liberdade e auto-determinação sexual; nem menores objecto de
medidas tutelares sancionatórias;
- Não tratar discriminatoriamente pessoas em função da
cor, raça, religião, nacionalidade ou sexo;
- Não recolher declarações ou imagens que atinjam a
dignidade das pessoas;
- Respeitar a privacidade;
- Não falsificar ou encenar situações, abusando da boa-fé
do público;
- Não recolher imagens ou sons por meios não autorizados,
a não ser em caso de manifesto interesse público;
Para a
imprensa Regional, o respectivo estatuto acrescenta ainda o seguinte:
- Respeitar escrupulosamente a verdade, o rigor e a
objectividade da informação;
- Observar os limites ao exercício da liberdade de
imprensa nos termos da lei.
Pela
Constituição da República, são deveres dos media do sector público, e dos jornalistas que neles trabalham, “salvaguardar a
independência perante o Governo, a Administração e demais poderes públicos, bem
como assegurar a possibilidade de expressão e confronto de diversas correntes
de opinião”.
Outros
deveres do jornalista são habilitar-se
com o título legal necessário, de acordo com as circunstâncias, ao exercício da
profissão, normalmente a Carteira
Profissional de Jornalista; e ainda abster-se de desempenhar tarefas
incompatíveis com o exercício da profissão.
As
incompatibilidades — actividades que pela sua natureza são susceptíveis de
comprometer os restantes deveres profissionais — encontram-se descritas no
Estatuto do Jornalista pela seguinte ordem:
- Funções de angariação, concepção ou apresentação de
mensagens publicitárias;
- Funções de marketing, relações públicas,
assessoria de imprensa e consultoria em comunicação ou imagem;
- Orientação ou concepção de estratégias comerciais;
- Exercício de funções em organismo ou corporação
policial;
- Serviço militar;
- Funções de membro do Governo da República ou de
governos regionais;
- Funções de presidente ou vereador em autarquia local.
Considera-se
igualmente actividade publicitária, que o jornalista deverá consequentemente
rejeitar, o recebimento de ofertas ou benefícios não identificados claramente
como patrocínios concretos de actos jornalísticos, e que visem, através do
jornalista, divulgar produtos, serviços ou entidades.
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Comunicação Social, SA,
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da Comunicação de Massas, col. Comunicação/Acção, Edições Asa, Rio Tinto,
Porto.
[55]
. O estudo envolveu pesquisas nos EUA, Grã
Bretanha, França, Alemanha e Japão, responsáveis por mais de de 50 por cento do
mercado mundial de papel.
[56]
. Quinze por cento dos utilizadores
afirmaram ler menos frequentemente a edição impressa dos jornais a que acedem
online; 8 por cento passaram a lê-la mais; a grande maioria, 74 por cento,
afirmou que a leitura de publicaçõess digitais não alterou em nada os seus
hábitos de consumo de jornais tradicionais.
[57] . In Wired News, “Newspapers Ding the Web”.
[58]
. Por vezes, anedota ou não, dizia-se in
the old eighties que determinados tipos de análise, sobretudo nas áreas da
cultura, crítica e espectáculos, eram inspiradas por revistas estrangeiras que poucos ou nenhuns, à excepção do autor, liam. E
também os estudantes já descobriram o potencial de fornecimento e impunidade do
novo medium.