Televisão interactiva: o estado da arte em 2002 e linhas de evolução

Célia Quico


Índice

Abstract: Um ponto de vista sobre o estado da arte em Televisão interactiva, com destaque para Portugal e para o caso particular do serviço da TV Cabo. Ainda o destaque para alguns dos produtos mais inovadores lançados durante 2002, em Portugal e no Reino Unido - este último considerado o líder desta indústria. Finalmente, a apresentação de algumas das tendências mais fortes no sector para o curto-médio prazo.

Palavras-Chave: Televisão Interactiva, Programas Interactivos, Enhanced TV, Jogos iTV, Serviços de Comunicação, SMS-TV, Convergência dos Media.

Introdução

Qual o estado da arte em Televisão Interactiva e quais as tendências de desenvolvimento a curto-médio prazo deste novo meio interactivo são as duas questões que este artigo pretende abordar, de forma não exaustiva, apresentando um ponto de vista pessoal baseado na análise da indústria em Portugal e no Reino Unido.

Em poucas palavras, Televisão Interactiva é o resultado da convergência entre a televisão e as tecnologias interactivas. Os serviços de televisão Interactiva actualmente disponíveis no mercado permitem aos utilizadores consultar guias de programação electrónicos, aceder a serviços como video-on-demand e pay-per-view, ainda aceder à Internet para enviar e receber e-mails, desfrutar de jogos multi-utilizador, efectuar compras e até realizar transacções financeiras. Tipicamente, estes serviços são acedidos através de um aparelho de televisão e de um aparelho descodificador, vulgarmente denominado set-top box.

Os serviços de Televisão Interactiva mais avançados do mundo estão disponíveis na Europa, onde também se registam as taxas mais elevadas de penetração de televisão digital e, consequentemente, de Televisão Interactiva. O destaque vai para o Reino Unido, que claramente lidera o desenvolvimento deste novo meio interactivo.

No entanto, é difícil prever o futuro de uma indústria que ainda está no seu início. Por um lado, ainda não é pacífico qual o aparelho que irá oferecer Televisão Interactiva à maioria dos espectadores: será a set-top box, o telefone móvel, o PC, o PDA? Será antes uma combinação de vários aparelhos?

Por outro lado, há a questão de qual o serviço ou aplicação que irá potenciar a rápida, massiva e rentável expansão da Televisão Interactiva: será o Electronic Programming Guide (EPG), o Video-On-Demand, o Personal Video Recorder, os serviços de comunicação, os programas interactivos? Apesar de já levar uns bons anos esta demanda pela killer application - como que o Santo Graal dos cruzados das novas tecnologias -, ainda há muitas incertezas na mente dos operadores, canais e demais produtores de conteúdos e soluções interactivas.

Antes de avançar mais na formulação de respostas para estas duas questões, importa clarificar alguns conceitos e categorias fundamentais para a melhor compreensão deste universo. Assim, os serviços interactivos tipicamente oferecidos por um operador de pay-TV podem ser categorizados da seguinte forma:


Tabela: Adaptado de P. Looms ``Developing interactive formats for digital TV and broadband'', apresentado no TRAM iTV Workshop, Junho 2002.
Categoria: Definição: Exemplo:
Programa em
Enhanced TV
Um programa de televisão que oferece funcionalidades interactivas relacionadas com o programa, para o qual não é necessário canal de retorno para interagir.

Legendas e karaoke que o utilizador pode activar e desactivar sempre que quiser,

Informação adicional relacionada com documentários e noticiários,

Consulta de múltiplos canais de vídeos (exemplo: Wimbledon)

Programa Interactivo Um programa de televisão que oferece funcionalidades interactivas relacionadas com o programa, com canal de retorno para interagir, de forma a aceder a mais conteúdo, participar em sondagens e passatempos ou a enviar mensagens, entre muitas outras possibilidades.

Walking with the Beasts (documentário interactivo)

ROFL (concurso interactivo para jovens)

Who Wants to be a Millionaire? (concurso interactivo)

Serviço Enhanced TV Um serviço de televisão associado a um canal ou ao operador de pay-TV que oferece funcionalidades interactivas (podem estar ou não relacionados com os programas), para o qual não é necessário canal de retorno para interagir. O utilizador pode explorar a qualquer momento este tipo de serviços.

Electronic Programming Guides (EPG)

BBC's Digital Text

BBC's I-Bar

Serviço de Televisão Interactiva (informação) Um serviço de televisão associado a um canal ou ao operador de pay-tv que oferece funcionalidades interactivas (podem estar ou não relacionados com os programas), para o qual é necessário canal de retorno para interagir. O utilizador pode explorar a qualquer momento este tipo de serviços.

Barra Interactiva (TV Cabo Interactiva)
Serviço de Televisão Interactiva (transacção) Um serviço de transacções seguras normalmente associados ao operador de pay-TV que oferece funcionalidades interactivas personalizadas (pode estar ou não relacionados com os programas). O utilizador pode explorar a qualquer momento este tipo de serviços.

Jogos

Video On Demand

T-commerce

T-banking

Serviço de Televisão Interactiva (comunicação) Um serviço de transacções seguras normalmente associados ao operador de pay-TV que oferece funcionalidades interactivas personalizadas para fins de comunicação.

E-mail

Comunicação peer-to-peer

Notificação do canal ou do operador pay-TV para o utilizador



Tabela: Fases de desenvolvimento dos serviços de Televisão Interactiva.
Fase: Exemplos de Serviços: Exemplos de Operadores:
TV interactiva

de primeira geração

Acesso a um Electronic Programming Guide (EPG),

Acesso a mais conteúdos de texto,

Possibilidade de votação em respostas múltiplas,

Pay-per-view.

Sky Brasil, BR

TV interactiva

de segunda geração:

Acesso a conteúdos de vídeo e áudio (exemplo: mosaico multi-câmaras);

Personalização de acesso a conteúdos;

Video-on-demand;

Acesso a serviços de comunicação como email;

Sky Digital, UK

NTL, UK

CanalSatellite, FR

TPS, FR

Via Digital, ES

TV interactiva

de terceira geração:

Jogos multi-utilizador;

Programas interactivos com a possibilidade de influenciar o decorrer do programa;

Video-on-demand;

Chat e Messenger

Kingston Interactive Television, UK

TV Cabo interactiva, PT


Finalmente, ainda que este novo sector das indústrias da Comunicação esteja a dar os primeiros passos, podemos já identificar diferentes fases de desenvolvimento dos serviços actualmente disponíveis um pouco por todo o mundo (tabela 2).

Nos próximos capítulos serão desenvolvidos os seguintes temas:

Reino Unido: líder incontestável em TV Digital e TV Interactiva

Em finais de 2002, o Reino Unido possuía a maior taxa de penetração de televisão digital da Europa: 39,5% de lares com acesso segundo dados do Independent Television Commission, o órgão que regula a televisão comercial a nível nacional1. Relativamente aos principais operadores de TV digital, o destaque vai para o operador de televisão digital satélite (DTH) Sky Digital, que ultrapassa os 6 milhões de subscritores com acesso a serviços interactivos. Já os operadores de cabo NTL e Telewest atingiram respectivamente os 1.200.000 e 830.000 subscritores com acesso a televisão digital e respectivos serviços interactivos2.

O Reino Unido não só lidera em termos de penetração de TV digital como também em termos do impacto e desenvolvimento de serviços de TV Interactiva. A Sky Digital tem vindo a ser o player mais activo neste sector, quer como produtor de serviços (Sky Sports Active, Sky News Active) quer como distribuidor de serviços interactivos. Em 2002, a Sky Digital investiu de forma significativa no relançamento os serviços de televisão interactiva, de que é exemplo a campanha promocional protagonizada pelo personagem Lil' Red Button Man, a incentivar os espectadores a pressionarem o botão vermelho do comando para acederem aos serviços interactivos. De referir ainda que a Sky Digital em 2002 lançou no mercado britânico um comando tipo semelhante aos das principais consolas de jogo no mercado, para reforçar a apelatividade da sua variada e extensa oferta de jogos.

Na área dos broadcasters, a BBC posicionou-se como o interveniente mais activo no desenvolvimento de produtos de televisão interactiva desde o lançamento de Wimbledon 2001, tendo em 2002 consolidado a sua imagem de empresa na vanguarda da TV digital interactiva. De Janeiro a Agosto de 2002, a BBC produziu 57 serviços interactivos e, para 2003, o broadcaster de serviço público tem planos ambiciosos, em particular para o desenvolvimento de serviços baseados na participação dos espectadores.

No entanto, em 2002 também se assistiu a despedimentos e falências em empresas de Televisão Interactiva no Reino Unido e não só, nomeadamente, a despedimentos massivos nas principais plataformas no mercado, como foi o caso da Open TV, Liberate e Microsoft TV (uma nota: apesar destas três empresas serem americanas, os seus principais clientes estão na Europa). A Open TV anunciou a dispensa de 47% dos seus quadros, em Outubro de 2002, ou seja, 315 dos seus empregados. A empresa sediada em Mountain View, California, divulgou ainda na ocasião que iria proceder ao encerramento de oito das suas delegações regionais3. Já a Liberate anunciou mais recentemente, em Janeiro de 2003, o despedimento de cerca de 30% dos seus quadros, que corresponde a um corte de 180 empregados. No primeiro quadrimestre de 2003 mais de 50 trabalhadores da empresa serão dispensados4. Finalmente, a Microsoft anunciou em Abril de 2002 que iria dispensar pessoal da divisão Microsoft TV, quatro meses depois de ter anunciado o corte de pessoal na divisão Ultimate TV. Assim, o gigante do software dispensou 60 trabalhadores da Microsoft TV, o que representa 10% do total dos trabalhadores da divisão. Já anteriormente tinham sido demitidos cerca de 140 trabalhadores da divisão Ultimate TV, o que representou sensivelmente 33% do pessoal5.

O melhor de 2002 no Reino Unido: and the winners are...

Idos que vão os tempos de grandes (enormes!) investimentos em serviços e aplicações interactivos, com planos de negócio demasiado optimistas e muitas vezes distanciados da realidade, a questão verdadeiramente crítica é a rentabilização rápida do investimento. A expressão "Show me the money" do filme "Jerry Maguire", talvez melhor do que qualquer outra, sintetiza esta preocupação central dos players da indústria dos novos media.

Neste campo, o histórico da Televisão Interactiva deixa muito a desejar, já que tem vindo a coleccionar alguns falhanços de peso, como o serviço Full Service Network, lançado em Dezembro de 1994 em Orlando, Florida. Este serviço da Time Warner veio a custar mais de 100 milhões de dólares (cerca de 100 milhões de Euros) e que apenas conseguiu angriar 4.000 clientes, antes de encerrar em 19976.

No entanto, novos serviços de Televisão Interactiva e formatos cross-platform já estão a gerar receitas significativas quando não mesmo impressionantes, como aponta a analista da indústria de novos media Ferhan Cook, para operadores e produtores de conteúdos7. Apostas, jogos, programação interactiva e interacção TV-SMS são os principais geradores de receitas para os players da indústria. A título de exemplo, refira-se que em 2002 as receitas dos serviços interactivos disponibilizados pela Sky Digital atingiram os 186 milhões de libras (cerca de 280 milhões de Euros), quase o dobro do valor de 2001. Ainda, metade deste valor foi proveniente de apostas, tendo os restantes 93 milhões de libras vindo das participações em programas interactivos, jogos e passatempos tipo trivia8.

Utilizando a perspectiva de inovação e/ou de impacto junto dos espectadores, dos muitos produtos de Televisão Interactiva lançados no mercado inglês, destacava os seguintes:

Test The Nation

O programa ``Test the Nation'' deu a possibilidade aos espectadores de calcular o seu Quociente Intelectual em simultâneo com os seis grupos de pessoas em estúdio. Transmitido a 11 de Maio de 2002, os espectadores podiam participar através dos serviços de digital satélite, digital cabo e via web e assim obter a sua pontuação.

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Figuras 1 e 2: Programa iTV ``Test the Nation- BBC

Segundo dados da BBC, 45% de todos os espectadores com ligação digital satélite participaram no programa e 100.000 pessoas participaram via web. Ainda, de acordo com um inquérito realizado pela BBC junto de 800 lares, 26% dos lares acompanharam o programa. O programa foi galardoado com o prémio EMMA 2002 na categoria de Prémio de TV Interactiva, devido à integração total da interactividade no formato televisivo, dando uma dimensão adicional à participação do público. Ver vídeo em:
http://www.broadbandbananas.com/testthenation.wmv

BBCi Pyramid Challenge

O programa ``Pyramid Challenge - The Book of Buried Pearls" foi publicitado como sendo a primeira série de aventuras interactiva a ser transmitida em televisão. O formato do programa pode ser definido como um híbrido: o ``Pyramid Challenge'' é um produto que conjuga documentário, narrativa interactiva e jogo electrónico num só produto.

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Figuras 3 e 4: Programa iTV ``Pyramid Challenge - The Book of Buried Pearls- BBC, Sky Digital

O programa oferecia o acesso a quatro canais de vídeo, para que o utilizador pudesse escolher o seu percurso no decorrer da transmissão do programa, através do comando. O utilizador era motivado a fazer uso da seu sentido de observação e senso comum, para guiar o apresentador através de uma série de desafios no Egipto dos nossos dias. O programa segue Ian Wright desde Londres, passando pelo sul do Egipto até à grande pirâmide em Gizé. Aqui, os utilizadores enfrentam um derradeiro desafio: abrir a câmara secreta do faraó. Se seleccionar a direcção correcta, o utilizador é premiado com um número que faz parte de um código secreto para abrir uma tomba e ter a possibilidade de ganhar uma viagem ao Egipto. Ver vídeo em:
http://www.broadbandbananas.com/pyramid.wmv

BBCi Kingston The Hull

Quem quiser ver a Televisão do futuro deve experimentar o serviço de TV digital de banda-larga oferecido a cerca de 10.000 clientes da Kingston Interactive Television. O projecto foi galardoado com o prestigiado prémio International Electronic Multimedia Awards -EMMA 2002 - na categoria de Serviço de TV Interactiva e foi nomeada para o prémio de inovação técnica pelo British Academy of Film and Television Arts (BAFTA).

O BBCi Hull é considerado como a plataforma de testes mais avançada em televisão digital no Reino Unido - e provavelmente em todo o mundo, acrescento. A BBCi Hull é um dos serviços disponíveis no serviço de televisão digital de banda larga Kingston Interactive Television (KIT), do Kingston Communications Group.

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Figura 5: Ecrã de entrada do BBCi Hull

Segundo informação na área do web site da BBC dedicada à divulgação do projecto-piloto, esta plataforma é utilizada para oferecer uma combinação única de televisão tradicional, video on demand, serviços de informação nacional e local, bem como a próxima geração de programas interactivos. Um dos aspectos mais interessantes do BBCi Hull é o facto de ter uma equipa de jornalistas dedicados à cobertura local de noticias, que podem ir desde notícias relacionadas com a política e a economia, a histórias com interesse humano e mesmo o boletim meteorológico. Ver vídeo e mais informações em:
http://www.bbc.co.uk/humber/bbci_hull/

Portugal: o impasse em TV Interactiva e TV Digital

Em Junho de 2001, a TV Cabo tornou-se um dos primeiros operadores no mundo a lançar um serviço de televisão digital interactiva, tendo sido o primeiro a nível mundial a oferecer a funcionalidade de gravação de vídeo digital numa set-top box por cabo com bi-direccionalidade, com base na plataforma Microsoft TV Advanced.

Se 2001 foi um ano de grandes expectativas, já 2002 se pode caracterizar como sendo um ano de impasse e mesmo de alguma decepção. Em Junho de 2001, a empresa anunciava que o objectivo era atingir os 100.000 clientes até ao final desse mesmo ano. No entanto, viria a atingir apenas 2.500 clientes em Dezembro de 20019. Se do lado da angariação de clientes as coisas não correram bem, também do lado da consolidação da indústria se verificaram grandes dificuldades. O mesmo fenómeno que se verificou em Inglaterra ocorreu em Portugal neste sector durante 2002, com empresas dedicadas ao desenvolvimento de soluções para TV interactiva a fecharem portas ou serem obrigadas a despedir pessoal, bem como foram encerrados departamentos que estavam dedicados a este tipo de desenvolvimento em diversas empresas.

Em finais de Janeiro de 2003, a empresa viria a anunciar publicamente que o serviço chegou a oito mil lares10, número que corresponderia a cerca de 24 mil utilizadores. Ao fazer este anúncio, a TV Cabo avançou ainda que considerava ultrapassados os problemas da fase experimental e pretendia massificar o serviço.

A empresa ainda anunciou o lançamento de novos serviços e produtos de televisão interactiva, nomeadamente, de uma versão low-end do serviço, que deve arrancar no primeiro trimestre de 2003. Em Março, a TV Cabo deverá informar com mais detalhe os potenciais clientes sobre os produtos e respectivos preços11. Confrontada com um momento difícil para a economia, com os problemas técnicos de uma plataforma complexa e pouco madura, bem como pela reduzida apetência do público por este tipo de serviços - como correctamente sintetizou o jornalista Pedro Fonseca - a TV Cabo continua a enfrentar dificuldades em impor o seu projecto.

Por outro lado, há ainda a ter em conta a Plataforma de Televisão Digital Portuguesa (PTDT), S.A, consórcio ao qual foi atribuído em Agosto de 2001 a licença de âmbito nacional para o estabelecimento e exploração de uma plataforma de Televisão Digital Terrestre12. O consórcio formado pela SGC do Grupo Pereira Coutinho (80%), RTP (10%) e SIC (10%), prevê investir um total de 658 milhões de euros. Após alguns adiamentos do início da comercialização do serviço de TDT, o Governo autorizou que o arranque das operações decorresse em Fevereiro de 2003, ainda que o consórcio tenha pedido adiamento até Agosto de 2003. A justificação para o adiamento prendeu-se, segundo o consórcio com a necessidade de disponibilizar o serviço fazendo uso da plataforma Multimedia Home Platform (que à partida será a norma de TV interactiva na União Europeia)13.

O melhor de 2002 em Portugal: e os vencedores são...

Das diversas aplicações e serviços lançados durante o ano de 2002, o destaque vai para os seguintes serviços, verdadeiramente inovadores e que igualam com o que de melhor foi desenvolvido um pouco por todo o mundo neste sector:

``Noites interactivas''

O ``Noites interactivas'' foi o primeiro programa a ser totalmente interactivo em Portugal: o programa foi transmitido ao vivo no canal promocional da TV Cabo, o Canal 21, desde Março a Julho de 2002, todos os dias úteis, entre as dez e a meia-noite. A acção do talk-show decorria em dois estúdios diferentes: no estúdio principal a apresentadora Luísa Castel-Branco falava com os seus convidados sobre um dado tema ou tópico irreverente, enquanto no segundo estúdio, outro apresentador discutia com vários convidados, cujas opiniões eram comentadas pelos espectadores interactivos, através de opiniões expressas no fórum de debate.

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Figuras 6 e 7: Programa ``Noites Interactivas'' , Canal 21 - TV Cabo interactiva

O fórum era uma das funcionalidades disponíveis para os utilizadores da ITV Cabo, os quais podiam também seleccionar diferentes ângulos de vídeo, votar qual dos convidados deveria ir para o estúdio principal e mesmo escolher qual o tópico que deveria ser debatido durante os últimos 30 minutos do programa. Os utilizadores podiam também enviar questões e opiniões, que os apresentadores muitas vezes introduziam no debate em estúdio.

Uma das características mais inovadoras do programa interactivo, foi o facto de ter integrado video-grafismo com o envio de convites interactivos. Desta forma, todos os espectadores viam surgir convites para interagir (``escolha a câmara para ver o estúdio 2'', ``seleccione votar, para escolher o tópico'', etc''), mas somente os utilizadores do serviço iTV Cabo poderiam aceitar estes convites interactivos e, desta forma, aceder à aplicação interactiva do programa. O sistema que gerava o video-grafismo estava ligado directamente ao back-office da aplicação interactiva, disparando convites interactivos quando o video-grafismo era lançado. A GO TV foi a empresa responsável por este desenvolvimento, bem como pelo design do interface e pelo back-office.

Jogos Multi-Utilizador

Os jogos multi-utilizador disponíveis no serviço da TV Cabo interactiva permitem a cada utilizador escolher um ``avatar'' entre um vasto leque de personagens divertidos. Este avatar irá representá-lo(a) em vários ambientes virtuais de jogo. Por exemplo, para o jogo de cartas ``Sueca'', a metáfora é o salão: neste ambiente, os utilizadores podem encontrar várias mesas ``de jogo'' com quatro cadeiras. O utilizador escolhe uma das mesas e pode jogar com outros jogadores reais ou mesmo com robots (automático). Depois de terem entrado na sala, os jogadores podem não só jogar entre si como também conversar através da funcionalidade chat. Os outros utilizadores podem ver os jogos ou até mesmo conversar - no entanto, também há a possibilidade de trancar a mesa, de forma a que os jogadores possam ter privacidade. A Ciberbit é a empresa responsável pelo desenvolvimento dos jogos multi-utilizador.

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Figura 8: Jogo multi-utilizador - ``Jogo da Sueca", TV Cabo interactiva

Até Janeiro de 2002 os jogos multi-utilizador contavam com mais de 26.000 utilizadores registados - de notar que estes jogos só se encontram disponíveis no serviço da TV Cabo interactiva, ainda que haja planos para os disponibilizar noutras plataformas, tais como os PDAs e os PCs. A utilização dos jogos multi-utilizador ultrapassa de longe a dos outros jogos disponíveis: com efeito, os jogos multi-utilizador são acedidos em média dez vezes mais do que o segundo jogo mais utilizado, o "Kognis Classic".

``Cover Legislativas 2002''

A aplicação "Cover Legislativas 2002" distinguiu-se por apresentar os três canais generalistas em simultâneo, permitindo seguir as emissões especiais dedicadas às eleições. Para além desta funcionalidade, os utilizadores podiam aceder aos últimos dados disponíveis sobre os resultados das eleições, quer os dados gerais, quer os dados por distrito. Finalmente, os utilizadores tinham a possibilidade de trocar opiniões em diversos fóruns de debate da aplicação.

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Figura 9: Serviço "Cover Legislativas 2002", TV Cabo interactiva

A simplicidade e eficácia deste serviço interactivo são duas das mais-valias que ofereceu a quem teve a oportunidade o de utilizar. A possibilidade de visionar os canais e de ouvir a rádio TSF foi outra das features do "Cover Legislativas 2002". A Innovagency foi a empresa responsável pelo desenvolvimento do serviço, bem como pelo design do interface e pelo back-office.

Novas tendências e linhas de evolução em Televisão Interactiva

Com base nos exemplos mais significativos de serviços interactivos disponibilizados pelos diferentes operadores, bem como nos casos de sucesso (e de insucesso) de que há conhecimento é possível extrair algumas lições:

Assim sendo, apontava cinco grandes áreas de desenvolvimento para Televisão Interactiva a curto e médio prazo:

  1. novas funcionalidades e formas de utilização do Personal Video Recorder,

  2. serviços de Comunicação e formação de comunidades,

  3. convergência com Telemóveis,

  4. convergência com Jogos electrónicos,

  5. serviço público de Televisão Interactiva.

1) Novas funcionalidades e formas de utilização do Personal Video Recorder

O Personal Video Recorder (PVR) é muito mais do que um simples substituto digital para o gravador VHS analógico. Ao permitir a gravação de vídeo de forma simples a partir de um EPG, o PVR traz comodidade ao utilizador que não tem uma boa relação com a funcionalidade de temporização de gravações do VHS. Mas o mesmo EPG dá a possibilidade de fazer pesquisa por género televisivo, horário, nome de actor/ actriz, permitindo assim como que definir a sua própria grelha de programação. Ainda, alguns modelos vão constituindo o perfil do utilizador, baseado nas escolhas que efectua, passando a recomendar ou mesmo a gravar automaticamente os programas considerados adequados para o perfil em causa.

Mais importante do que continuar a nomear as funcionalidades dos PVRs no mercado é fornecer alguns dados significativos sobre como é que os consumidores estes produtos as utilizam. Assim, de acordo com um relatório publicado pelo CNW Marketing Research publicado a Julho de 2002, 71% dos utilizadores de PVR usam a funcionalidade de fast forward durante os intervalos publicitários em horário nobre18. Este relatório foi baseado em inquéritos telefónicos realizados a cerca de 1.000 clientes de PVRs de marcas como a TiVo e a ReplayTV.

Por outro lado, em Fevereiro de 2002, a TiVo publicou dados muito interessantes sobre a utilização do PVR durante o maior evento desportivo do ano nos E.U.A. - o Super Bowl. A empresa monitorizou mais de 10.000 dos seus clientes, de um total de 280.000 clientes, de forma a analisar que jogadas do desafio ou que anúncios de publicidade iriam escolher para rever19. Concluíram que os utilizadores do PVR recorreram mais à funcionalidade de Instant Replay para rever os anúncios do que para rever as jogadas do Super Bowl. O mais revisto dos anúncios foi o transmitido pela Pepsi, protagonizado pela cantora pop Britney Spears. A aparente contradição destes dados pode ser explicada pelo carácter muito particular dos anúncios que são exibidos nos intervalos do Super Bowl: muitos dos anúncios são propositadamente produzidos para este evento, existindo mesmo uma grande competição entre as marcas para ver qual delas consegue deixar a impressão mais forte dos espectadores.

Pouco a pouco, a indústria da Publicidade começa a estar a par do potencial do PVR como um novo canal de marketing, já que podem ser mais eficazes os conteúdos pré-gravados e as funcionalidades de distribuição de publicidade a um público-alvo específico. Empresas como a Best Buy e a Universal Pictures já fecharam negócio para disponibilizar os seus anúncios interactivos nos PVRs da ReplayTV e TiVo20.

Mas atitude que perdura nos publicitários e anunciantes é de grande desconfiança relativamente ao PVR, sendo mesmo considerado uma ameaça, porque os espectadores passam a poder gravar de forma simples e prática os programas para o disco rígido da caixa e a usar a funcionalidade de fast forward para "escapar" aos intervalos publicitários. Outra questão que levantou polémica no ano passado envolveu o fabricante de PVRs SONICblue. Em Maio de 2002, a empresa recebeu ordem de tribunal para revelar os hábitos individuais de visionamento de televisão dos seus clientes do modelo Replay TV 4000, em resultado de uma série de processos metidos em nome de 28 estúdios de cinema e de televisão. Estes reclamaram que o modelo acima mencionado possibilitava a infracção de copyrights ao permitir os utilizadores enviarem entre si ficheiros de vídeo digital pela Internet, sem autorização dos detentores dos direitos21.

O contra-ataque veio, curiosamente, dos clientes dos PVR da ReplayTV: com a ajuda da organização Electronic Frontier Foundation, cinco dos clientes processaram as principais empresas de Media, tais como a AOL Time Warner and NBC22, alegando que os utilizadores de PVR têm o direito de ``saltar'' os anúncios e de tocar programas gravados através da Internet sem serem processados por infracção de copyright. O debate promete continuar...

2) Serviços de comunicação e formação de comunidades

A empresa de referência em TV interactiva - a BBC - tem vindo a oferecer aos seus espectadores a possibilidade de escolher mais conteúdo: vídeo, áudio ou votações, por exemplo. O próximo passo é conseguir obter os comentários e opiniões dos espectadores, referiu Gronmark, que ficou convencido sobre o potencial do chat em TV após de observar o índice de respostas a um programa especial da BBC Choice, que deu a possibilidade aos espectadores de acederem a um chat na Web sobre o programa23. Assim, a BBC planeia colocar o chat no centro da sua programação interactiva. Ainda, a BBC está a testar serviços de chat em Hull, através do serviço Kingston Interactive Television (KIT), como parte de uma série dramática interactiva, permitindo aos espectadores entrarem em contacto entre si para discutir as intrigas da série, entre outros assuntos.

Desta forma, as comunidades virtuais já não são exclusivo dos computadores pessoais. A Televisão Interactiva e os telefones móveis agora oferecem serviços semelhantes que antes só podiam ser acedidos pelo PC, como observou Howard Rheingold: "Durante os anos 90, as pessoas conviviam nos novos fóruns disponibilizados na pela Internet , que acediam através dos seus computadores pessoais. Milhões de pessoas em todo o mundo projectaram-se no ciber-espaço, onde personalidades despojadas de corpo partilharam conhecimentos, travaram guerras inflamadas, conduziram negócios, criaram indústrias, tagarelaram, organizaram, maquinaram, colaboraram, conspiraram, inventaram e divertiram: as comunidades virtuais. Se souberem onde procurar, é já possível detectar os primeiros sinais do deslocamento das comunidades virtuais do computador e do ciberespaço42. O acesso às comunidades virtuais está a tornar-se uma experiência que se pode viver "em qualquer momento e em qualquer lugar".

3) Convergência com Telemóveis

Se a formação de comunidades virtuais é um elemento-chave para a televisão interactiva, também o é a convergência dos media. O recente - e inesperado - sucesso da convergência entre serviços móveis e programas de televisão indicam que a fusão e combinação dos media pode ser uma receita vencedora para criar produtos verdadeiramente atractivos e populares.

Para além dos exemplos já conhecido do "Big Brother" e de alguns programas da MTV, há a destacar o caso do inovador formato ``Boogie'', da Danish Broadcasting Corporation, lançado a 7 de Janeiro de 2002 e que foi transmitido em directo de terça a sábado, com repetições à noite. Os espectadores do programa tinham a possibilidade de se juntar ao clube Boogie através do web site Skum/Boogie e, desta forma, publicar o seu próprio perfil e uma foto. Durante o programa, os espectadores podiam participar por SMS, nomeadamente, enviar comentários, seleccionar qual dos vídeos preferiam ver ou colocar uma questão ao entrevistado em estúdio. O programa possuía uma audiência média de 90.000 espectadores, dos quais 9% interagiam por SMS, tendo o clube Boogie atingindo os 40.000 subscritores três meses após o inicio da sua transmissão24.

Ainda a ter em consideração o caso do programa "Popstars", que no Reino Unido recebeu mais de 200 mil votos e pedidos de informação via SMS por hora nos picos de acesso. Na Alemanha, um programa de televisão que teve por objectivo quebrar o recorde de SMS TV recebeu num período de 90 minutos mais de 2,4 milhões de SMSs. De referir também que o último "MTV European Music Awards" registou um acréscimo de 90% no envio de votos por SMS relativamente ao ano anterior, tendo estado disponível a votação em 16 países europeus - o que envolveu um total de 40 operadores móveis25.

Tal como refere a analista de novos media Ferhan Cook, assiste-se a um número crescente de programas de televisão que estão focados em oferecer interactividade via telemóvel, com envio de SMS em vez de disponibilizarem uma aplicação interactiva por via de um operador de televisão. Este fenómeno prevalece em países onde as plataformas de televisão digital interactiva ainda são de pouca relevância, como é o caso da Alemanha, Holanda, Finlândia e as Filipinas, aponta Ferhan Cook. A interactividade por SMS dá a possibilidade aos broadcasters de se relacionarem com as audiências mais jovens, gerando receitas adicionais sem ter que fazer os avultados investimentos necessários ao desenvolvimento de aplicações interactivas26.

4) Convergência com jogos electrónicos

A convergência da TV interactiva com o universo dos jogos é demonstrada na perfeição pelo novo formato de entretenimento da BBC "Fightbox" , que integra o acesso a um web site específico, a participação em jogos e o visionamento de televisão. Pensado para os membros mais viciados em jogos das novas gerações, o formato funde as novas tecnologias de jogos e de estúdio para criar um desporto futurista baseado nos combates de gladiadores. Os concorrentes poderão desenhar e construir os seus próprios guerreiros nos seus PCs, a partir de componentes disponíveis, e após terem treinado as suas criações, farão com que as mesmas participem num torneio. As melhores serão escolhidas para competirem entre elas, nas finais Fightbox a serem transmitidas pela televisão. O software Fightbox será disponibilizado online no website da BBC no início de 2003 e o programa será transmitido no Outono de 2003 no canal BBC327.

A Endemol anunciou no início de 2002 que iria lançar um novo formato de TV Interactiva, denominado ``1 vs. 100'', um programa tem vindo a ser transmitido pela estação de serviço público de televisão Holandesa Tros desde há dois anos. Este programa é também um jogo na internet, com o mesmo ambiente da TV, um jogo SMS e um jogo MMS, segundo o responsável da produtora Taco Ketelaar. O formato já foi adaptado pelo canal VT4 na Bélgica, RTL na Alemanha e estava a ser negociado com um canal da Grécia e um canal Espanhol28.

Por outro lado, a convergência da TV interactiva com o universo dos jogos também é evidente com o lançamento do Sky Gamepad. O novo comando da Sky Digital é destinado aos espectadores que pretendem usufruir dos jogos do serviço de uma forma mais semelhante ao das consolas de jogo mais populares no mercado29.

5) Serviço Público em Televisão Interactiva

Ainda que haja uma necessidade imperiosa de desenvolver projectos de facto rentáveis, não deve ser descurado o investimento no serviço público de Televisão Interactiva - da mesma forma que deve ser assegurado o serviço público de Televisão. Desta forma, chamava a atenção para a necessidade de investigação e desenvolvimento nas seguintes áreas:

T-Learning

O potencial das plataformas de televisão digital interactiva para o ensino à distância via Televisão Interactiva está por explorar, tal como aponta o estudo ``T-learning; creating the ubiquitous learning experience - the role of iTV'', da PJB Associates, acrescentando todavia que existem já exemplos que demonstram algumas formas possíveis de oferecer novas formas de aprendizagem mais activas e apelativas30.

Entre os casos de estudo apresentados no estudo, destaque para o serviço interactivo que complementa o canal da BBC CBeebies, destinado desenvolver as capacidades de aprendizagem de crianças em idade pré-escolar, com actividades muito simples e graficamente muito apelativas. Ainda de realçar o serviço BBCi GCSE Bitesize, que permite aos estudantes acederem a informação adicional sobre as matérias escolares em texto e vídeo a pedido, e assim proceder à revisão do que aprenderam na sala de aula. Este serviço está apenas disponível em Kingston upon Hull através do operador Kingston Interactive Television31.

O ensino à distância via televisão digital interactiva está, assim, a emergir como um potencial meio de grande importância para criar novas oportunidades de aprendizagem nos lares, conclui o estudo acima mencionado, recordando que na Europa 95 a 99% dos lares têm um televisor enquanto que apenas 40 a 60% possuem um PC com acesso à Internet32. Para o investigador da Universidade Lusófona Manuel Damásio a personalização de serviços e aplicações é a principal vantagem trazida pelas tecnologias de TV interactiva e é aquela que vai determinar o seu sucesso33.

T-Government

A televisão digital oferece muitas oportunidades para o Estado melhorar os seus serviços e a forma como são distribuídos, lê-se na introdução do ``Digital Television - a policy framework for delivering e-government service to home'', um documento para consulta pública lançado no Reino Unido em Outubro de 2002 pelo Office of the e-Envoy34. Neste documento é ainda referido que a televisão digital é um meio privilegiado para fazer chegar serviços interactivos junto de quem não tem Internet ou é relutante em utilizar a Internet.

Mais uma vez, o Reino Unido encontra-se à frente dos demais países, quer no desenvolvimento de serviços T-Government, quer na promoção do debate público sobre o assunto. A título de exemplo, refira-se que o portal iTV para a Administração e Central e Local ``UK online interactive'' foi lançado em Abril de 2002 no operador de DTH Sky Digital. Dos projectos-piloto que têm vindo a ser testados, vale a pena mencionar um dos projectos do Department of Health, denominado "Living Health". Os utilizadores deste serviço tiveram a possibilidade de aceder a informações e aconselhamento em assuntos relacionados com a temática de Saúde e Bem-Estar, informação sobre farmácias de serviço e clínicas. Todavia, as funcionalidades mais interessantes eram as de agendamento de consultas com o médico de família e a de consulta via televisão com uma enfermeira, que através das indicações fornecidas pelo utilizador através do telefone podia mostrar vídeos e imagens para ajudar a melhor identificar o problema e mesmo recomendar o que deveria fazer o paciente35. Esta iniciativa pioneira esteve disponível a uma audiência estimada de 50.000 espectadores da área de Birmingham, por intermédio do operador de cabo Telewest.

Acessibilidade e TV Interactiva

O Serviço Público de Televisão deve ser capaz de garantir o acesso à informação por parte da população com deficiência auditiva, deficiência visual, deficiência mental e de outras com necessidades especiais tais como as das pessoas analfabetas36 - este princípio fundamental é defendido pelo Centro de Engenharia de Reabilitação em Tecnologias da Informação e Comunicação (CERTIC) da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro na sugestão de aditamento ao relatório do Grupo de Trabalho sobre Serviço Público de Televisão, enviada ao Governo em 30 de Outubro de 2002.

O CERTIC sugere que se recorra a funcionalidades e conteúdos como a legendagem, tradução em língua gestual, descrição de imagens e conversão de texto em voz. Ainda, chama a atenção para a necessidade de assegurar a introdução progressiva de interfaces - receptor de televisão digital, set-top boxes e soluções para computador - compatíveis com tecnologias de apoio para cidadãos com necessidades especiais, tais como: comando remoto adaptado, teclados e ratos especiais, leitores de ecrã, sintetizadores de fala e terminais braille37. No Guia de Acessibilidade à Televisão Digital Terrestre por cidadãos com necessidades especiais, datado de 17 de Dezembro de 2000, o CERTIC apresenta quinze recomendações que devem ser tidas em linha de conta pelos operadores de televisão digital terrestre. Ainda, este centro de investigação defende que seja levada a cabo uma experiência semelhante à do canal "ZZJ MUNDOVISIÓN", específico para pessoas com deficiências sensoriais, transmitido em Espanha de 1998 a 2002 através do operador de DTH Via Digital38. Como é referido na introdução do guia, para que estes objectivos sejam alcançados há que conjugar políticas activas, compromissos sociais e iniciativa. Uma tarefa difícil mas de grande relevância social.

Gerontecnologia e TV Interactiva

A necessidade crescente de idosos terem acesso às novas tecnologias é tema de estudo da gerontecnologia - domínio que estuda o envelhecimento e as tecnologias -, que visa em particular, desenvolver novos produtos e serviços voltados às pessoas idosas. Este campo de investigação e desenvolvimento interdisciplinar tende a ganhar cada vez mais importância, com o envelhecimento das populações dos países mais desenvolvidos, como é o caso de Portugal.

De referir que, segundo os Censos 2001, a população idosa com 65 ou mais anos representava 16,4% da população Portuguesa, ou seja, 1 693 493 indivíduos. Em 1991, a população com 65 ou mais anos era constituída por 1.342.744 indivíduos: em 10 anos registou-se um acréscimo de 26,1% da população mais idosa, enquanto que a população total do país cresceu 5% no mesmo período de tempo39. Assim, torna-se cada vez mais necessário adaptar a idade da reforma ao prolongamento da vida e da forma saudável dos indivíduos idosos, tal como refere o estudo textitO Envelhecimento em Portugal: Situação demográfica e socio-económica recente das pessoas idosas", publicado pelo Instituto Nacional de Estatística40.

Ainda segundo este estudo, a questão que envolve o envelhecimento e as pessoas idosas exige uma reconceptualização e uma reforma da gestão da idade. A solução proposta pela Organização Mundial de Saúde em 1997 foi o conceito de envelhecimento activo, que teve por base permitir aos idosos que permaneçam integrados e motivados na vida laboral e social. Escusado será dizer que a adopção das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC) são parte importante deste processo e, ainda, que a televisão digital interactiva poderá ser um meio privilegiado de acesso para os mais idosos aos benefícios das TIC.

Em conclusão, pode-se afirmar que o melhor ainda está para vir. Tal como referia Ferhan Cook num recente artigo de balanço da indústria, talvez estejamos a assistir à emergência de uma nova geração de entretenimento, na qual os grandes players estão a definir as opções mas em que são os parceiros mais pequenos e "leves" que conseguem com eles criar produtos verdadeiramente apelativos41.

Indo mais longe e sendo mais radical, Glorianna Davenport - investigadora e membro fundador do prestigiado Media Lab do Massachusetts Institute of Technology - prevê que a era da set-top box chegará rapidamente ao fim, à medida que os dispositivos móveis se tornam mais poderosos, ubíquos e interligados entre si: "então, a excitação para o utilizador virá da criação de novas formas de interfaces tácteis para fazer hiper-ligações, espaços públicos com écrans para encontros acidentais e planeados e alcance móvel para novas formas narrativas que o entusiasmem43. Ainda que tenha uma grande afinidade com esta visão utópica, preferia em vez de declarar morte à set-top box deixar em aberto a possibilidade da coexistência pacífica e harmoniosa dos diferentes aparelhos que possibilitam o acesso a serviços de TV interactiva.

Referências



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